quinta-feira, 27 de maio de 2010

Por tu padre

Se somos uma catarse, que tal pensar a mãe como o espaço e o pai como o tempo? Nesse contexto, nós três seríamos uma família e o eu, vejam só, uma encruzilhada.Talvez, assim, tornaremos imagética a força não linear que trazemos conosco, pois, sendo um ípsilon, não seremos um mero risco, mas, um asterisco ainda que em fase inicial.

Por tu padre” fala da relação de paternidade. É o tempo quem nos fala sobre nossa descendência, sobre os séculos de sonhos, de dores e também de ideologias que carregamos, mesmo sendo materialmente órfãos. Não precisa ser homem, não precisa ser parente, não precisa ser vivo, mas “o pai” pode sempre ser visto como aquele que nos diz sobre como era o mundo antes de nossa chegada e ouve conosco sobre como ele ficou no momento em que isso aconteceu. Identificar sua presença em nós pode ser, e sugerimos, uma aventura em torno de nossa própria história, pois todos temos alguém que representa o universo ao lado de quem é a nossa parte.

“Por tu padre” é uma atualização dessa aventura pela qual todos podemos ser desafiados. No enterro do pai, o filho, já aos trinta anos, resolve esclarecer a dúvida sobre sua verdadeira ascendência. Na cerimônia do funeral, está o antigo amante de sua mãe, amigo do seu pai oficial oficialmente morto. E seu possível pai verdadeiro oficialmente vivo. No elenco, estão Adrián Navarro, estrela de TV e cinema na Argentina, fazendo o filho. E Federico Luppi, tão (amado) e conhecido por suas participações inesquecíveis em “Elsa e Fred” (2005) e “O Labirinto do Fauno” (2006), entre várias outras produções mundialmente reconhecidas, fazendo aquele que talvez seja o pai.

A aparência melodramática do roteiro, escrito pelo jornalista brasileiro Dib Carneiro Neto, não é o mais importante desse texto que foi o penúltimo texto encenado por Paulo Autran ao lado de Claudio Fontana em 2005. Sob chuvas e trovões, a dúvida que persegue o filho desde os seus 12 anos, é apenas a visão particular de uma interrogação que diz respeito ao universo: qual nossa relação com o passado e até que ponto inventamos a roda?

O teatro argentino que o 17º Porto Alegre em Cena conhece é aquele que foge das cascas e viaja verticalmente atrás de dúvidas. O afeto, a sedução e o sexo são degraus que tornam o homem humano, a parte que particulariza o universo de forma racional, não menos animal. A direção de Miguel Cavia deixa o contexto de um mero ajuste possível de contas em um diálogo sobre a solidão e a ternura, a identidade de alguém quer ser alguém no mundo. E um alguém que tem sempre muitos caminhos para seguir e muitas possíveis origens. O importante é aceitar o desafio.

*


Ficha Técnica:


De: Dib Carneiro Neto
Direção: Miguel Cavia

Elenco:
Federico Luppi
Adrián Navarro

Cenário e Figurino: Marcelo Pont
Iluminação: Gabriel Cavia
Produção Executiva:  Giuliana Bacchi - Maria Fernanda Sciuto
Produção:  Cristian Cristofani, Ariel Diwan, Carlos Bacchi
Duração: 1h10min
Classificação etária: 12 anos

Estreou: 24 de março de 2010

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Psicose 4h48

Sara Kane (Inglaterra – 1971-1999) estava fazendo 28 anos quando escreveu “Psicose 4h48”. Alguns dias depois, seu corpo foi encontrado no hospital onde a já conhecida dramaturga estava internada. Há quem diga que o enforcamento se deu com as toalhas do seu quarto. Outros, os cadarços de seu All Star. Sua última peça é seu quinto texto e compõe uma obra que tem sido muitas vezes encenada na Europa e no mundo na última década. Talvez, o mais interessante do universo de Kane seja a dúvida que paira na cabeça de quem assiste a uma de suas peças: é ficção ou é realidade? É o desabafo de uma pessoa que (é) está doente ou o virtuosismo de uma artista? "4.48 Psychosis" é um amontoado de diálogos sem nome. O desafio da produção é investigar esse texto contemporâneo desde a forma e esse é outro aspecto interessante de qualquer montagem de Kane. A narrativa é fragmentada, não-linear trazendo à tona o universo de uma mente perturbada, depressiva, profunda tida por muitos como chocante e até obscena. A produção da montagem brasileira que virá ao 17º Porto Alegre em Cena comenta que não é incomum pessoas saírem no meio da sessão conturbadas pela situação sufocante.

Urgência. Estamos todos doentes desse distúrbio individual que nos faz escravos do discurso que criamos sobre nós mesmos ou que criam a nosso respeito. Talvez dos sonhos que não vemos realizados ou das fantasias que se quebram. Nunca um relacionamento de uma semana fez tanto sentido aos solteiros e causou tanta dor. Nunca o não envio de um email, o status de bloqueado no Facebook ou 150 caracteres teve tanto poder. A solidão real versus os perfis II e III porque não cabem mais amigos no perfil I do Orkut é o drama moderno de todas as idades, dos Irmãos Karamazov, passando pelos Irmãos Coragem, chegando nos Irmãos Cohen. Todos compartilham de um lado da mesma realidade, um elemento da mesma ficção, (a)o mesmo tempo. 4h48min é horário em que a maioria dos suicidas morrem. E talvez esse seja, numa longa e inesgotável lista, um dos motivos que fazem com que o texto de Sara Kane seja tão significativo hoje.

Rosana Stavis e Marcelo Bagnara são os atores que assumiram as falas do texto de Kane na produção dirigida por Marcos Damaceno. Uma produção rígida que proporciona a dose de sarcasmo, de gargalhadas e de hostilidade que o texto requer para sua atualização.Os silêncios e a angústia presentes na cadeira de rodas e na projeção de pensamentos da protagonista: detalhes que são imperdíveis por quem assiste a essa montagem que estreou em 2004.

Para encerrar, citamos o próprio diretor:

"Psicose 4h48 é expedição a uma região da mente que a maior parte de nós preferiria nunca visitar, mas da qual muitas pessoas nunca escapam. Aqueles que por ela são apanhados ficam normalmente sem voz.
Que a peça tenha sido escrita enquanto a autora sofria uma das crises de depressão, que é uma condição destrutiva e não criativa, é um ato de generosidade. Que a peça seja tenha sido bem sucedida artisticamente é positivamente heróico.
O suicídio coloca sempre uma questão, e o suicídio de um escritor deixa material que os vivos podem apenas ler atentamente à procura de respostas. Inevitavelmente, a sombra da morte de Kane recairá sobre suas peças. Mas o desafio para o leitor das últimas peças de Kane não é descobrir a autora que está por detrás das palavras, mas sim, atentar sobre o que há de nós por detrás dessas peças."


*


Ficha Técnica:

Texto: Sarah Kane
Tradução: Laerte Melo
Direção: Marcos Damaceno

Elenco:
Rosana Stavis
Marcelo Bagnara

Sonoplastia: Vadeco
Iluminação: Nadja Naira e Fábia Regina
Figurinos: Maureen Miranda
Design Gráfico: Foca
Foto: Chico Nogueira
Realização: Marcos Damaceno Companhia de Teatro






Duração: 1h15min



terça-feira, 25 de maio de 2010

Tobari - Como um fluxo inesgotável


Há cinquenta anos, Tatsumi Hijikata (1928-1986) e Kazuo Ohno (1906) chocaram as platéias com sua nova dança. Ankaku Butoh, a dança das trevas, parecia grotesca, ofensiva aos padrões de beleza estética sustentados pelos bailarinos clássicos japoneses no país recém saído de duas bombas atômicas. Se hoje, ao assistir “Tobari – Como um fluxo inesgotável”, o Japão e o mundo recordam esse momento de ruptura artística é porque comparam a “monstruosa” exploração da feiúra e da condição humana e suas dores, expostas no que hoje conhecemos apenas como Butô, com o sublime trabalho dimensional de Ushio Amagatsu. “Tobari” é uma palavra japonesa que significa “cortina”, um pano que separa o espaço em duas partes, ou, ainda, o momento diário em que o dia se torna noite e a noite se torna dia. É esse o momento da encenação.

O palco é coberto de escuridão a não ser pelas estrelas que vemos de início. O ser humano aparece e ouvem-se gritos sussurrados, gritos silenciosos. Paradoxos. Antíteses: a tristeza e a alegria, a luz e a escuridão, a vida e a morte: tudo balança delicadamente como uma cortina. Três bailarinos pintados de branco, a marca do butô, aparecem na escuridão. Eles negam a individualidade e refletem a luz. Ação: grupos de bailarinos ricocheteiam no palco como astros nesse espaço. E são pegos pelo vento cósmico, estrelas que são. Tornam-se coloridos como a vida que dança, que baila, que festeja, que grita. É o final do espetáculo: o próprio Amagatsu aparece e solta um grito silencioso, tenso, educado, concentrado, expressivo. O coreógrafo já conta quase sessenta anos, esses envolvidos pelo estudo e prática do minimalismo, como também o seu colega e amigo de muitos trabalhos, o compositor Philip Glass. Não há quase nada em cena e a peça se organiza em nascimento, morte e renascimento. O ciclo vital.

Formado em 1975 por Ushio Amagatsu, da segunda geração de Butô, o Grupo Sankai Juku é um grupo essencialmente masculino cuja tradução do nome é “o ateliê da montanha e do mar”, fazendo referência à topografia japonesa. Desde 1980, o grupo se apresenta pela Europa em turnês anuais de apresentações e oficinas difundindo suas estética muito particular pelo mundo em diversas áreas não só na dança. Atualmente, o Sankai Juku é uma das companhias japonesas que mais se apresentam no exterior (mais de 43 países visitados regularmente, cerca de 700 cidades) com uma atenção toda especial para a França e o Théâtre de la Ville de Paris, onde, a cada dois anos, desde 1982, estreia suas novas criações.

Em 2001, Amagatsu lançou um livro chamado “Diálogo com a gravidade”. Segundo o coreógrafo, a gravidade é uma aliada do bailarino, não uma adversária. Enquanto o bailarino ocidental tenta esquivar-se da gravidade através de sua energia em saltos, piruetas, etc, o bailarino de Amagatsu dialoga com ela em um movimento em que tudo é concentração e economia de dispêndio muscular.

Nos mais de trinta anos de trabalho, Ushio Amagatsu coleciona várias distinções. O 17º Porto Alegre em Cena se sente muito honrado com sua visita e lista algumas delas:
- Chevalier des Arts et Lettres. França
- Presidente do júri dos “Rencontres Internationales de Bagnolet” - França
- Prêmio do Ministério das Relações Exteriores do Japão
- Prêmio do “Syndicat National de la Critique” por Trois Soeurs - França
- Prêmio da Associação dos Críticos do Japão
- “Laurence Olivier Award”: Melhor Produção Coreográfica por Hibiki - Inglaterra
- Presidente do Júri do “Toyota Choreography Award” - Japão
- “Art Encouragement Prize” do Ministério da Educação e Cultura do Japão
- “Grand Prix of the 6th Asahi Performing Arts Awards” - Japão
- Prêmio do “Syndicat National de la Critique” por Lady Sarashina – França

À lucidez e ao romantismo de “Tobari”, todos são convidados.
*

Ficha Técnica:

Estreia Mundial em 2008 – Théâtre de La Ville / Paris

Direção, Coreografia e concepção - Ushio Amagatsu
Música composta por Takashi Kako, YAS-KAS, Yochiro Yoshikawa

Elenco:
Ushio Amagatsu
Semimaru
Sho Takeuchi
Akihito Ichihara
Ichiro Hasegawa
Dai Matsuoka
Nobuyoshi Asai
Norihito Ishi

Direção tecnica: Kazuhiko Nakahara
Iluminação: Genta Iwamura
Chefe de palco: Tsubasa Yamashita
Som: Akira Aikawa

Co-produção:
• Théâtre de la Ville Paris, France,
• Kitakyushu Performing Arts Center, Fukuoka Pref. Japon
• Sankai Juku, Tokyo, Japon

Turnê brasileira realizada com com a ajuda da ACA (Agency for Cultural Affairs), governo do Japão - 2010
O Sankai Juku conta com o apoio da Shiseido.

Duração: 1h25min
Classificação: 16 anos

O idiota

Talvez tenha havido um tempo em que o bem fazia bem e o mal fazia mal. Em que homens casavam com mulheres e só com elas tinham filhos. Em que o preço das coisas não mudava, em que as cartas chegavam e os antivírus eram confiáveis. Talvez tenha existido uma época em que virgindade era sinal de virtude, em que os padres não tinham sexo, em que as crianças eram puras e os comunistas eram maus. Esse, no entanto, não é o tempo do Porto Alegre em Cena. Nós vivemos a difícil tarefa da adversidade, da prazerosa situação de não saber ao certo com o quê lidamos, nem por quanto tempo lidaremos, com a certeza dialética de que o bem pode também fazer o mal. E, às vezes, ao mesmo tempo.

A bondade do Príncipe Míchkin, protagonista de “O Idiota”, por exemplo, destrói os seres humanos a sua volta, sejam eles bons ou maus. Ela faz aquele que se julga bom duvidar de sua própria bondade. E aquele que é mau desconfiar de si mesmo. Une, num só eixo de dúvida, um rol de personagens e constrói uma história sobre um pântano caudaloso e frio, cortante e, ao mesmo tempo, volúvel como o gelo. A bondade sufoca.

Fiódor Dostoiévski (1821-1881) ainda não tinha cinquenta anos quando publicou “O Idiota”, um dos seus romances mais importantes. No entanto, convivia com epilepsia desde os dezessete, o que o coloca ao lado de nomes como Machado de Assis, Flaubert, Hemingway e Van Gogh. A relação entre a doença e o escritor fez nascer o Príncipe Lev Nikoláevitch Míchkin, protagonista do romance, idiota se entendermos a palavra não como um xingamento, mas como um termo que designa, de forma pejorativa, aquele que sofre de idiotia, aqui relacionada à epilepsia. O escritor, que é tido como o pai do existencialismo e, hoje, é um dos maiores nomes da literatura mundial, tendo escrito também “Crime e Castigo” e “Os Irmãos Karamazov”, entre outros, constrói uma atmosfera em que cada personagem é visto do ponto de vista de sua verticalidade, daí a exploração do universo psicológico de cada ser e sua relação paralela com os demais. Rogójin ama Nastássia que ama Míchkin que ama Aglaia ou ama Nastássia ou, talvez, sobretudo, ama Rogójin.

O Príncipe é bom e sofre as desventuras de sua bondade ao voltar pra sua terra natal a fim de receber a herança de sua família já toda falecida. São mais de seiscentas páginas de muito diálogo em que, em cada um, ao leitor é oferecida a concretização máxima da possibilidade de ganchos narrativos. Uma fala puxa a outra e os membros do discurso se prendem mutuamente só menos do que presos estão a si próprios. O livro demorou apenas quatro meses para ser escrito e Dostoiévski se baseou em Dom Quixote, de Cervantes, para criá-lo. E, se prestarmos a atenção nisso, vamos entender a função do príncipe frente aos demais personagens: lutar contra a autodestruição, sendo, ele próprio, uma arma destrutiva.

Eimuntas Nekrósius (Lituânia, 1952), o mais célebre diretor báltico, completa trinta anos de teatro internacional com a atualização do romance russo “O Idiota” para o palco. Eis duas informações importantes: a) O diretor não completa três décadas de dedicação ao teatro, mas aniversaria o conhecimento que o mundo tem a respeito do seu trabalho, premiadíssimo desde “Pirosmani, Pirosmani”, em 1981. b) O romance que completa 150 anos é a primeira aventura de Nekrosius (Honorary Worker or Art of the Lithuanian em 1997) no universo de Dostoiévski.

Nekrosius, que já esteve em outras edições do Porto Alegre em Cena com “Hamlet” (2001), “Otelo” (2006) e “Fausto” (2008), faz parte do grupo de Lev Dodine, Kristian Lupa e Anatolij Vassiliev, menos conhecidos a nível mundial, que trabalham dentro de um regime de permanente experimentação teatral. Seus nomes participam do todo que inclui Peter Brook, Eugenio Barba, Peter Stein, Peter Zadek, Patrice Chéreau, Klaus-Michael Grüber, Ingmar Bergman, Luca Ronconi, Bob Wilson, Georgio Barberio Corsetti, Stéphanne Braunhweig, Richard Jones e Tadeusz Kantor, encenadores que marcam a “contemporaneidade no teatro”. Ou seja, estamos falando em um diretor cujo trabalho traz um imediatismo que, por dialogar tão fortemente com a atualidade das relações, talvez só poderemos refletir de forma consistente sobre ele no futuro. Para o hoje, fica o dever de prestarmos a atenção no que ele tem a dizer e diz.

O teatro da Companhia Meno Fortas (“Fortaleza da Arte”, em português), fundada em 1997, vale destaque entre seus pares por usar meios técnicos simples em detrimento da tecnologia. Não é um teatro com vídeos e luzes, mas um teatro de atores e histórias. Como em Kantor, os dispositivos cênicos escolhidos e a originalidade conceitual está na linguagem expressiva, no gesto minimalista. Por outro lado, sua ascendência em Bob Wilson, está na forma como música e adereços tem sua combinação concebida. É um teatro de metáforas, com fôlego épico e imagens expressionistas. E a capital gaúcha lembra muito fortemente do bloco de gelo derretendo sobre Hamlet sobre quem também pingava, ao mesmo tempo, cera quente de velas.

“O Idiota” teve 115 ensaios em 6 meses de preparação. Tem 5 horas e meia de duração e 3 intervalos. Para o próprio Nekrosius, “o teatro é um antídoto contra a pressa insensata dos nossos tempos”, justificando a longa duração do espetáculo. O ator principal (Daumantas Ciunis) é recém formado pela escola de interpretação, o que é outro ponto interessante dessa produção que tem circulado pelo mundo sendo ovacionada pela crítica especializada. No 17º Porto Alegre em Cena, estará em cartaz no Theatro São Pedro, durante três concorridíssimas sessões.


*


Ficha Técnica:

de Fiódor Dostoievski
Tradução para lituano: Pranas Povilaitis
Encenação: Eimuntas Nekrosius
Cenografia: Marius Nekrosius
Figurinos: Nadezda Gultiajeva
Música original: Faustas Latenas
Desenho de luz: Dziugas Vakrinas
Desenho de som: Arvydas Duksta

Elenco:
Daumantas Ciunis
Salvijus Trepulis
Elzbieta Latenaite
Diana Gancevskaite
Margarita Ziemelyte
Vidas Petkevicius
Migle Polikeviciute
Vaidas Vilius
Vytautas Rumsas
Ausra Pukelyte
Vytautas Rumsas Jr.
Neringa Bulotaite
Tauras Cizas

Produção: Meno Fortas

Duração aproximada 5h20in
Classificação etária: 12 anos
 Legendas em português

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Na solidão dos campos de algodão

Encontros. Você está indo de um lado ao outro. Outra pessoa está indo do outro lado a este. Param (?). Olham-se e continuam. Beijam-se e continuam. Discutem e continuam. Casam-se, têm filhos e continuam. Morrem juntos e não continuam. Não param e continuam. Você decide mudar de trajeto e continua com o outro. O outro decide mudar de trajeto e continua com você. Uma terceira pessoa aparece e você, ou o outro, continua com quem chegou. O outro ou você fica ou continua. A chegada é sempre contínua.

O francês Bernard Marie-Koltès tinha 38 anos quando escreveu, em 1986, seu maior sucesso, “Na solidão dos campos de algodão”, dirigido pela primeira vez por Patrice Chereau. Falava de encontros. Deles falava também em 1996, no 3º Porto Alegre em Cena, dirigido por Gilberto Gawronski. Também em 2002, dirigido por Paulo José, na 9ª edição do nosso festival. Nesse ano, dirigido por Caco Ciocler, o texto não falará de chegadas. Como nunca falou em todas célebres montagens do texto mundo afora.

O cenário de Bia Junqueira expressa esses encontros de uma forma muito inteligente. Cinco gangorras dispostas em cena em paralelo. Os dois personagens, sobre os quais não sabemos e nem queremos saber qual busca e qual é buscado, quem vai e quem segue, corre ou percorre, equilibram-se nesse palco suspenso e apoiado. Para que um esteja no alto, o outro precisa estar embaixo. E a possibilidade da fuga de um dos dois faz o jogo ser findável. Talvez o encontro permaneça não pela distancia da chegada, mas pelo medo de que o encontro termine. E o subir e descer desse palco quíntuplo, à guisa do que diz o texto, concorda com a fluidez existente nos olás e adeus que trocamos com desconhecidos, amigos de anos, irmãos.

Os encontros não carecem de materialidade. Koltès se foi prematuramente há mais de vinte anos, mas, com ele, a Leal e Valerosa Cidade de Porto Alegre continua se encontrando. Namoradas de outros anos, vez que outra, surgem na memória. A poltrona do velho pai ainda está na sala. A primeira nota vermelha em Educação Física grita na lembrança. Os encontros existem, atormentam, trazem paz. E o encontro de hoje é a possibilidade da existência de algo no amanhã.

O diálogo nessa solidão de campos de algodão, feito entre os atores Armando Babaioff (O Santo e a Porca/Gota d’água, direção de João Fonseca) e Gustavo Vaz (Por trás do céu, direção de Sóh), ou entre o Dealer e o Cliente, fala sobre a possibilidade de algo, a existência visível de fertilidade para algo. Uma mesa limpa é a possibilidade do pó. O um é a possibilidade do dois. O alto tem, em si, o baixo. O início é meio se pensarmos que, antes dele, vem o fim. Não sabemos quando começou a história. Mas, começada, há a possibilidade do seu fim. É, na possibilidade do possível, nas dobras de significação, que estão o cerne do sentido, a força do vínculo. Um personagem deixou seu olhar cair sobre o outro. O outro leu como convite. O movimento da retina tinha, em sua dobra, a possibilidade do convite. O outro veio atrás do um. O olhar foi o encontro.

E, se essa montagem, cujas críticas fazem dele um dos melhores espetáculos do ano na seleção da revista Bravo!, e o 17º Porto Alegre em Cena, um dos mais bem qualificados eventos teatrais do planeta encontrarem você é porque a possibilidade do encontro não foi desperdiçada. E não interessa saber quanto tempo esse encontro vai durar. Mas, sim, que um veio atrás do outro. E ambos atrás de você.


*


Ficha Técnica:

De Bernard Marie-Koltès
Direção: Caco Ciocler
Com Armando Babaioff e Gustavo Vaz
Cenário: Bia Junqueira
Figurinos: Amanda Carvalho
Iluminação: Rodrigo Portella
Música composta e desenho de som: Felipe Grytz
Assistente de direção: Pablo Sanábio
Direção produção: Liliana Montserrat e Damiana Guimarães
Sonorização:Rossini Maltoni
Fotografia: Sérgio Baia

Classificação etária: 16 anos

Duração do espetáculo: 90 minutos

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Goran Bregovic & Weddings and Funerals Oschestra

Nascido em Saravejo, hoje na Iugoslávia, Goran Bregovic é conhecido pelos mais velhos como alguém que pode ser, pelo seu talento e seu currículo, comparado a compositores como Ennio Morricone (compositor dos filmes de Sergio Leone) e Nino Rota (compositor dos filmes de Federico Fellini). Esses também podem lembrar de sua banda de rock, “White Botton”, que fez muito sucesso nos anos 70. Os mais jovens, no entanto, podem se lembrar dele por sua assinatura nas canções do filme Borat, dirigido por Sasha Baron Cohen, além de suas premiadas participações em vários filmes do sérvio Emir Kusturica (O tempo dos ciganos, Arizona Dream, Underground – Mentiras de Guerra, entre outros).

Aqueles que, mais velhos ou mais jovens, não são do tipo que guardam os nomes dos compositores das músicas de seus filmes preferidos, podem encontrar nas palavras do próprio artista um convite para assisti-lo no 17º Porto Alegre em Cena:

“Música é a primeira linguagem humana e uma das mais difíceis de ser controlada socialmente pelos códigos culturais porque preexiste a existência da sociedade e da cultura. Esta é a linguagem em que eu me comunico com o público em (e de) todos os lugares.”

Lugar: a sociedade em que vivemos. Quando Goran Bregovic & Weddings and Funerals Oschestra se comunicam, existindo, assim, no mundo no espaço e também no tempo, eles tocam e cantam músicas de um lugar. Músicas dos Balcãs (Grécia, Turquia, Bósnia, Macedônia, Montenegro, Trácia, Kosovo, Sérvia, Croácia, Romênia, Eslovênia, Albânia e a Bulgária), países, lugares distantes do Brasil se só pensarmos em lugar como uma cor geográfica. O Leste Europeu, no entanto, vai parecer aqui do lado se pensarmos na música de Bregovic como ela tem sido proclamada pelo mundo afora: intensa, vigorosa, apaixonada, exótica, fascinante! Um ritmo que contagia quem ouve e se deixa levar pela sensação. Ritmos ciganos e sons búlgaros tradicionais, trilhas sonoras alucinadas, criativamente compostas com metais e vibratos. A miscigenação na música.

O show que abre o 17º Porto Alegre em Cena é ao vivo, isto é, Goran Bregovic e sua orquestra estarão em Porto Alegre falando de perto para perto de algo que, sob muitos aspectos, nunca esteve longe. Sobre um lugar pequeno, talvez no Mar Adriático, que nos lembra a paz de um lar com cercas brancas e muita alegria. Uma cozinha quente com frigideiras de cobre penduradas, paredes caiadas, e noivas com flores na cabeça. Família, relações próximas. Festa.

O espetáculo se chama “Alkohol” e trará músicas do último CD de Bregovic, lançado em 2008. O disco traz treze faixas, quatro delas já aparecidas em outros álbuns do compositor, mas com novas roupagens. Novos arranjos para canções de antes que anunciam que as novas também, um dia, poderão receber outras cores. Bregovic é filho de pai croata e mãe sérvia. Além disso, é casado com uma bósnia muçulmana. O colorido de suas relações afetivas também está na forma como a lista de canções (uma produção francesa!) foi montada para a apresentação no 17º Porto Alegre em Cena, Além de “Alcohol”, Bregovic e sua orquestra interpretarão canções de outros de seus trabalhos, entre eles, canções compostas para o teatro.

O músico esteve recentemente muito envolvido com produções teatrais que motivam a sua participação em um festival internacional de teatro como o que construímos. Entre outras produções, por exemplo, em 2001, na Alemanha, Bregovic compôs as músicas de “A Divina Comédia: Inferno, o livro da alma”, baseado em Dante Alighieri, dirigido por Tomaz Pandur. Em 2004, na Itália, dirigiu “Karmen de Bregovic com Final Feliz”, baseado na ópera de Bizet.

Fazendo casar músicas de tantos países diferentes num mesmo espetáculo, grupos tão distintos numa mesma orquestra, corais e instrumentos diversos, o lugar de Bregovic recebe os mais velhos e os mais jovens. Os que gostam de cinema e os que gostam de teatro. Também aqueles que gostam de rock e de músicas folclóricas, de ópera e de instrumental, de violinos e de percussões. Acolhe quem gosta de música, quem se comunica, mas, sobretudo, quem ocupa o seu lugar nele.



*

Ficha Técnica:
 

Compositor e Diretor: Goran Bregovic

Weddings and Funerals Oschestra:

Banda de metais ciganos: Alen Ademovic (tambor, vocal), Bokan Stankovic (trumpete 1), Dalibor Lukic (trumpete 2), Stojan Dimov (saxophone, clarinet), Milos Mihajlovic (trombone 2) e Aleksandar Rajkovic (trombone 3, glockenspiel).

Vozes Búlgaras: Ludmila Radkova-Trajkova e Daniela Radkova-Aleksandrova.

Sexteto de vozes masculinas: Dejan Pesic (1º tenor), Nenad Cica (2º tenor), Igor Arizanovic (2º tenor), Vladimir Rumenic (barítono), Dusan Ljubinkovic (baixo) e Sinisa Dutina (baixa).

Quarteto de cordas: String quartet: Ivana Matejic (1º violin), Bojana Jovanovic (2º violino), Sasa Mirkovic (alto) e Tatjana Jovanovic (violoncelo).

Engenheiro de som: Dusan Vasi


Duração: 2h30min sem intervalo

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Happy Days

Mais próximo do que pensamos: Beckett.

Há quem diga que as peças desse dramaturgo irlandês são chatas, monótonas, entediantes. Lembram de “Esperando Godot”, aquele personagem que nunca vem. Lembram de diálogos intermináveis de “Fim de Partida” ou “Fim de Jogo”. Lembram de histórias que parecem não ter história e de aplausos intelectuais que dão vergonha aos bocejos da massa comum... O 17º Porto Alegre em Cena não quer que alguém se sinta envergonhado de já ter dormido em alguma apresentação de Beckett (e esse ano haverá duas montagens!). Dormir também é uma reação e, no teatro, todas as reações são válidas sem que haja hegemonia de expressões, desde que nenhum ronco, ou choro, ou gargalhada atrapalhe a concentração da pessoa ao lado ou da fila além. Teatro é, antes de tudo, social. E dormir socialmente é tão válido quanto aplaudir em conjunto.

Mas a questão é: por que esse dramaturgo é tão elogiado através dos tempos, tantas vezes montado e por nomes tão consagrados como Bob Wilson, cujo currículo de espetáculos (incluindo “Quartett”, grande participante do 16º Porto Alegre em Cena), de turnês e de prêmios faz dele um dos maiores encenadores do planeta nessa transição de séculos. O espetáculo em questão nesse texto é protagonizado, por exemplo, pela atriz Adriana Asti, estrela de cinema em filmes como "Rocco e seus irmãos” (Visconti, 1960), “Accatone” (Pasolini, 1961), “Antes da revolução” (Bertolucci, 1962), “Amargo despertar” (Vittorio de Sica, 1973), “O fantasma da liberdade” (Luis Buñuel, 1974) e vários outros, sem falar na sua importante participação em produções teatrais como “Cinza às cinzas”, de Harold Pinter. Por que, então, tanto incenso sobre um chato? Será que ele é realmente chato?

Winnie, a protagonista de “Happy Days”, está presa, caída numa armadilha, enterrada até a cintura, sem possibilidade de sair. Sua vida desconhece o passado e ela também não faz planos para o futuro. Tudo está como está. Winnie não é a heroína de uma história com princípio, meio e fim. Ela é a própria história e somente dentro dela se encontram o princípio, o meio e o fim e também o princípio novamente. Se olharmos para ela sem nos perguntarmos de onde ela veio e para onde ela vai, e escutarmos a sua pergunta sobre o que fazer da vida, talvez, perceberemos que há mais de Winnie em nós do que de qualquer história de guerra, de qualquer amor fatal, de qualquer grande espetáculo com helicópteros entrando cena. Porque o nosso dia a dia também não é feito de longas viagens e grandes decisões, mas do desafio de viver as vinte e quatro horas sem pular uma única delas, nem mesmo quando dormimos. Ao espectador é livre o direito de ver o buraco como uma rotina. Ou um trabalho. Ou um relacionamento do qual não se consegue sair. Winnie pode ser eu, pode ser você, pode ser o marido daquela amiga, a chefe do seu pai. O dia pode ser um ano, um mês, um festival, o tempo que não passa antes do ônibus vir, a ligação telefônica que não se completa, o email que ainda não chegou.

Winnie sorri. Winnie canta. E a frieza beckettiana se torna trágica ao tratar do destino como algo que é superior aos mortais. A chuva que destrói casas sobre morros, o câncer que consome um parente, o candidato não preferido que ganha a eleição. Winnie sorri. Winnie canta. E, assim, ela win. Vence adversidade do boleto que chega, do olhar não retribuído, do taxi perdido no dia de chuva. E vence sem cair na alienação, tampouco na submissão. A brasilidade de Winnie, quem sabe, está na coragem de sorrir e de cantar. E de encarar com gabardia qualquer desafio.

As cores de Bob Wilson estão aprisionadas nos matizes originais. Azul é azul, preto é preto, laranja é laranja. A variação está em nós. O princípio, o meio, o fim e o princípio novamente estão em nós. O artista propõe o mundo. Os mortais o desafiam. Nem sempre vencem. Mas sempre é possível sorrir.

Mesmo dormindo.



*


110 minutos (15min de intervalo)

Ficha Técnica:

Texto: Samuel Beckett
Direção, cenário e concepção de luz: Robert Wilson
Assistente: Daniel Schulze
Assistente de Direção: Christoph Schletz
Dramaturgia: Ellen Hammer

Elenco:
Adriana Asti (Winnie)
Yann de Graval (Willie)

Diretor Técnico: Amerigo Varesi
Desenho de Luz: A.J. Weissbard
Supervisão: Marcello Lumac
Figurinos e Maquiagem: Jacques Reynaud

Desenho de Som: Emre Sevindi
Técnico de Som: Paolo Cillerai
Eletricista: Fabio Bozzetta
Diretora de Palco: Sue Jane Stoker/Sara Thaiz Bozano
Técnico de Palco: Antonio Verde
Cabelo e Maquiagem: Jacques Reynaud/Mariarita Parisi
Administração da Companhia: Gaia Scaglione
Direção de Produção: Kristine Grazioli
 Produção: Change Performing Arts e CRT (Milão/Itália) Elisabetta di Mambro e Franco Laera
Fotos: Luciano Romano

terça-feira, 11 de maio de 2010

Antígonas - Buenos Aires


Universo feminino: estamos numa nave espacial a conhecer os planetas, os astros, os asteróides que o compõe. Qualquer coisa que se apresente dizendo se tratar de um universo (entre tantos) informa aquele que o visita sobre a importância de descobrir. Olhos atentos, pois estaremos investigando. Mas já não conhecemos (as) mulheres? Elas podem ser nossas mães, nossas colegas, nossas namoradas, professoras, amigas, vizinhas de porta. Podemos encontrar com elas em qualquer lugar, até mesmo no espelho, mas em “Antígonas” olharemos para elas como se nunca as tivéssemos visto. Porque essa experiência de olhar para o outro é, na verdade, um meio de produzir um jeito de olhar para nós mesmos sob um ponto de vista nunca dantes usado. “Antígonas” não fala de mulheres. Mas nos ajuda a ter um olhar feminino para olhar para nós mesmo, mulheres ou não.

Entre a complexidade e a imensidão do que há de feminino no nosso próprio universo, a produção argentina dirigida por Leonor Manso nos mostra a relação entre a constituição do ser mulher e o enigma. O misterioso, o proibido, aquilo que está além das fronteiras, da compreensão, da sorte, da razão e do sentimento. Não há como desvendar um enigma sem acabar com ele, sem destruí-lo. As quatro histórias que nos são contadas, ao longo dos 60 minutos de espetáculo, esgueiram-se pelo enigma, mas não se aproximam dele, não o destroem. Se a melhor forma de valorizar a fala é silenciar, beirar o mistério é valorizá-lo. O espectador, diante dessas narrativas, provoca, atende, busca o desconhecido e dele se serve. Mas não o resolve. Não o destrói. O mistério é sempre renovado e presente.

Ingrid Pelicori e Claudia Tomás, cada uma com um currículo que deixa ver mais de trinta anos dedicado ao teatro, ao cinema e à televisão de seu país, são o universo que essa história não mais que coteja. Duas atrizes, duas mulheres. Nada mais visto como tudo isso. Suas presenças em pontos específicos do palco apontam para suas ausências em outros pontos do mesmo lugar cênico. Os personagens que elas interpretam nos questionam sobre os personagens que não surgem nas histórias. As cores que vemos nos perguntam a respeito das cores que não vemos. A luz convive com a sombra. A instransponível regra creôntica de não poder enterrar o irmão Polinices, também filho de Édipo, na tragédia Sófocles, olha para a jovem Antígona e lhe provoca. Ao atravessá-la, dando descanso ao corpo morto, Antígona viva se sacrifica. Apenas pode estar num lugar, quem não está em nenhum outro. Não há meia vida, tampouco meia morte. No entanto, a mulher como universo consegue ser onipresente porque também pode ser oniausente. Alberto Muñoz ( 3º Poa em Cena: "Los Ultimos Días de Johnny Weissmuller"/7º Poa em Cena: "Abel Cazador de Cain"), homem, não menos renomado que as atrizes e diretora, ao recuperar o clássico construindo dramas contemporâneos, nos mostra a intersecção que foge ao maniqueísmo, à dualidade do bem e do mal, do aqui e do acolá, e nos fala da complexidade de cada dia de hoje e de amanhã. Algo que não entendemos, mas que vivenciamos.

A sensibilidade não está no texto, como também não está na escolha do elenco. O feminino não está no universo, ou então pensaríamos não haver também universo masculino. O sutil, e belo, está na direção de Leonor Manso, que foi para voltar e contar o que viu. Agora, e desde a estréia que aconteceu no último outubro em Buenos Aires, nos leva a conhecer esse lugar feminino, com já dissemos, tão cheio de planetas, astros, asteróides. Quando uma personagem sai de um lugar e vai para outro, sua falta lá é vista por quem investiga. Sua presença aqui é sentida por quem ouve. Assim, a poética de “Antígonas”, espetáculo cuja assistência é um convite do 17º Porto Alegre em Cena, está no trato da matéria humana como universo sem planícies nem caminhos, sem montes nem lagos. A existência como lugar não-lugar que se concretiza no movimento da voz, no deslize pelas situações, na interpretação de quatro histórias que se substituem e se trocam sendo diferentes, na desritualização do cotidiano pela ritualização do comum,na marca que morre hoje mas seguirá viva amanhã.

Percorre o espetáculo um som que nos lembra o ruído advindo de um caracol. Um caracol que sente saudades do mar e que não tem medo de impô-lo a quem o escuta em terra. O mar está em todo lugar, mesmo que à espreita do mistério que está por trás dessa presença sua que não vemos. Mas sentimos.

Ficha Técnica:
Texto: Alberto Muñoz
Elenco: Ingrid Pelicori e Claudia Tomás
Cenário: Leonor Mans
Realização Cenográfica: A & B Realizaciones Escenográficas
Desenho de Luz e Som: Pedro Zambrelli
“Cuencos”: Maia Mónaco
Canção Original “Bye Bye Maciel”
Letra: Alberto Muñoz
Música: Alberto Muñoz e Diego Vila
Piano: Diego Vila
Figurino: Elsa Keller
Fotografia: Magdalena Viggiani
Assistente de direção e produção executiva: Carolina Cacciabue
Direção Geral: Leonor Manso

Duração: 60 minutos.
Estreou 05 de outubro de 2010.