Se somos uma catarse, que tal pensar a mãe como o espaço e o pai como o tempo? Nesse contexto, nós três seríamos uma família e o eu, vejam só, uma encruzilhada.Talvez, assim, tornaremos imagética a força não linear que trazemos conosco, pois, sendo um ípsilon, não seremos um mero risco, mas, um asterisco ainda que em fase inicial.
“Por tu padre” fala da relação de paternidade. É o tempo quem nos fala sobre nossa descendência, sobre os séculos de sonhos, de dores e também de ideologias que carregamos, mesmo sendo materialmente órfãos. Não precisa ser homem, não precisa ser parente, não precisa ser vivo, mas “o pai” pode sempre ser visto como aquele que nos diz sobre como era o mundo antes de nossa chegada e ouve conosco sobre como ele ficou no momento em que isso aconteceu. Identificar sua presença em nós pode ser, e sugerimos, uma aventura em torno de nossa própria história, pois todos temos alguém que representa o universo ao lado de quem é a nossa parte.
“Por tu padre” é uma atualização dessa aventura pela qual todos podemos ser desafiados. No enterro do pai, o filho, já aos trinta anos, resolve esclarecer a dúvida sobre sua verdadeira ascendência. Na cerimônia do funeral, está o antigo amante de sua mãe, amigo do seu pai oficial oficialmente morto. E seu possível pai verdadeiro oficialmente vivo. No elenco, estão Adrián Navarro, estrela de TV e cinema na Argentina, fazendo o filho. E Federico Luppi, tão (amado) e conhecido por suas participações inesquecíveis em “Elsa e Fred” (2005) e “O Labirinto do Fauno” (2006), entre várias outras produções mundialmente reconhecidas, fazendo aquele que talvez seja o pai.
A aparência melodramática do roteiro, escrito pelo jornalista brasileiro Dib Carneiro Neto, não é o mais importante desse texto que foi o penúltimo texto encenado por Paulo Autran ao lado de Claudio Fontana em 2005. Sob chuvas e trovões, a dúvida que persegue o filho desde os seus 12 anos, é apenas a visão particular de uma interrogação que diz respeito ao universo: qual nossa relação com o passado e até que ponto inventamos a roda?
O teatro argentino que o 17º Porto Alegre em Cena conhece é aquele que foge das cascas e viaja verticalmente atrás de dúvidas. O afeto, a sedução e o sexo são degraus que tornam o homem humano, a parte que particulariza o universo de forma racional, não menos animal. A direção de Miguel Cavia deixa o contexto de um mero ajuste possível de contas em um diálogo sobre a solidão e a ternura, a identidade de alguém quer ser alguém no mundo. E um alguém que tem sempre muitos caminhos para seguir e muitas possíveis origens. O importante é aceitar o desafio.
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Ficha Técnica:
De: Dib Carneiro Neto
Direção: Miguel Cavia
Elenco:
Federico Luppi
Adrián Navarro
Cenário e Figurino: Marcelo Pont
Iluminação: Gabriel Cavia
Produção Executiva: Giuliana Bacchi - Maria Fernanda Sciuto
Produção: Cristian Cristofani, Ariel Diwan, Carlos Bacchi
Duração: 1h10min
Classificação etária: 12 anos
Estreou: 24 de março de 2010
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