Ella*
Ella é a nova produção dirigida por Patrícia Yosi, participante, em 2010, com Cuestión de princípios; em 2008, com Las aparencias engañan; e, em 2005, com Onetti en el espejo. Mais uma vez, a diretora uruguaia, também dramaturga e atriz, investe no teatro no seu estado mais puro: atores interpretando personagens diante de uma plateia. Não há projeções, não há trocas de figurinos ou de cenários, não há grandes movimentos de iluminação. Apenas dois atores, Álvaro Pozzolo e Sérgio Pereira, compõem o elenco, interpretando dois homens maduros dentro de uma sauna, cada um com pontos de vistas diferentes sobre a (in)fidelidade.
De início, o espectador sabe que ambos são amantes da mesma mulher, embora o marido seja um terceiro que não está em cena. O diálogo evolui apresentando novas possibilidades para a situação final, fazendo da produção a atualização de uma trama bastante bem amarrada e muito bem escrita pela argentina Susana Torres Molina. Cheia de peripécias, a história esbarra na repetição de discussões outrora apresentadas, mas se recupera a partir de novas informações. O desfecho pega de surpresa o espectador menos absorto e o fim deixa ver, sobretudo, duas belas interpretações.
As duas construções não são equânimes. É no personagem de Pozzolo que está o conflito, pois ele ama Ela, ou, pelo menos, mostra isso com mais intensidade. Embora o personagem de Pereira, mais adiante, também, confesse seus sentimentos por Ela, a forma como a interpretação desse se dá deixa ver um sentimento mais frio em relação a mulher de que ambos falam. É preciso que se diga que as duas interpretações estão a contento, uma vez que os personagens são absolutamente críveis nesse drama realista que ilustra, inclusive, duas formas de amar, ou duas formas de expressar o amor. As pausas, as ironias, as mudanças são marcas verossímeis que acrescentam ao texto e à viabilização dele na peça teatral apresentada.
Há alguns senões.
Na mesma medida em que os “gemidos femininos de prazer” são interessante uso do recurso nos momentos em que um personagem vai para a ducha, isto porque o som dribla o silêncio sem trazer novas e pesadas informações, os “gemidos masculinos de dor”, nas cenas de luta, atrapalham a fruição dos gemidos reais produzidos no palco. Porque os atores também gemem e não há silêncio, a trilha sonora, nesse caso, é redundante e desnecessária.
As cenas de luta carecem de mais marcas de credibilidade. Vários gestos são claramente falsos, o que exibe uma falta de técnica dos intérpretes, esses cujas construções são elogiáveis nos momentos de diálogo.
Ella acumula pontos positivos no cenário, nos figurinos, mas, sobretudo, na divisão do tempo da representação. Sessenta minutos é o tamanho ideal para a narração dessa história, sendo, pela forma como se dá, bastante bem aproveitado. Tem aqui, mais uma vez, uma valorosa participação do Uruguai na programação do Festival.
* Rodrigo Monteiro é crítico teatral
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