O standard do standard*
Quando fui convidada para escrever algumas linhas do show de Maria João e Mario Laginha aceitei sem pensar. Refletindo melhor depois, constatei que não tinha muita familiaridade com o repertório dela. Corri, então, na internet para ouvir coisas e ver vídeos.
Que beleza, uma cantora de jazz com um ótimo pianista.
E assim fui para o Teatro do Bourbon Country, na abertura do Festival Porto Alegre Em Cena, para assistir um show de standards de jazz.
Começou o show e já na primeira música um atmosfera diferente anunciava que alguma coisa iria acontecer ali. Na segunda música, Maria João pega um bloco e coloca na estante de partitura. Mas o tal bloco era um iPad que ela discretamente manuseava para ler as letras. Adorei!
Laginha e João manipularam as emoções da plateia em quase duas horas de show, com intimismo, lirismo, solos frenéticos de piano acompanhados de maracação percussiva com os pés, ela dançando sedutoramente em cumplicidade com a canção.
Momento arrepiante do show foi ao interpretar Beatriz (Chico Buarque), que depois confessou ser uma das músicas mais lindas do mundo, e ainda brincou que no seu camarim tinha uma foto da Marieta Severo.
O final do espetáculo é mais arrebatador ainda: Laginha sai discretamente do palco e deixa Maria João improvisar. Mas o que mais parecia ali era que seu corpo apenas tinha se tornado veículo de outras vozes que vieram dar o seu recado. Do tribal à ópera, fazia tudo parecer brincadeira. De tirar o fôlego!!!
Uma cantora solta, livre, feliz, suave, imprevisível. Um domínio e técnica absurdos.
Um pianista impecável, virtuoso, suingueiro e econômico.
Saí do show com alma lavada, valeu Luciano por repetir a dose esse ano.
A única ressalva que faço é quanto à iluminação do espetáculo, que interferiu em vários momentos, causando desconforto para quem estava na plateia. Refletores apontavam para o teto do teatro, numa parte metálica que refletia e ofuscava os olhos. E vamos combinar...soltar fumaça nos momentos mais intimistas da música é de última!!!!! Isso não é standard.
* Monica Tomasi é cantora.
2 comentários:
Trabalhar com arte, bem sei, é ,inexoravelmente, estar exposto á subjetividade, á sensibilidade, à opinião, ao julgamento alheio. Dito isto, como autor da iluminação do show de Maria João e Mario Laginha, gostaria de desenvolver um pouco este assunto tão breve e contundentemente citado por Monica Tomasi em sua crítica. Não se trata de justificativa ou contraponto, trata-se apenas de explicitar aos leitores deste espaço público e oficial um outro ponto de vista. Primeiramente concordo com Monica sobre a possibilidade de incidência de reflexo de luz na platéia, mas não concordo que estes reflexos tenham incidido " em quem estava na platéia", mas sim em ALGUNS POUCOS lugares da platéia, pois não havia luz direta (" no olho da platéia") e sim pontual e refletida, o que é bem comum, já que, como todos que frequentam teatros sabem, há lugares mais ou menos privilegiados tanto no que se refere a som quanto ao que se refere à luz, impossível para quem esta desenhando a luz de um show saber se tal ou qual efeito esta possivelmente, através de um reflexo, incidindo no olho da terceira ou quarta ou quinta fila. Quanto á fumaça, foi uma opção estética usa-la, muita gente não gosta, não acha que seja adequada àquele tipo de show, mas foi uma escolha minha, consciente, pensada e usada com parcimônia, sei que o equipamento não era silencioso como seria ideal, mas acioná-lo " nos momentos mais intimistas da música", é algo que nem me passa pela cabeça, muito embora respeite a sensibilidade de quem possa ter escutado. Enfim, espero ter contribuído com os leitores e me despeço dizendo que aceito e respeito a opinião de Monica assim como aceitei e respeitei as dezenas de elogios que recebi por este trabalho, inclusive um inesquecível, em cena aberta, da própria Maria João que disse durante os agradecimentos:"...a luz, nem vou falar, vocês estão vendo, é o mesmo iluminador que fez no ano passado...fantástica." Grande abraço.
Fabrício Simões.
Esqueci de dizer que neste mesmo blog, Rodrigo Monteiro faz uma outra apreciação da luz do espetáculo, mais um ponto de vista aos leitores. Gracias.
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