A comédia privada da vida como ela é...
(os textos de Nelson Rodrigues
e a teatralidade de Luis Artur Nunes)*
Quem me conhece sabe que não sou crítico teatral, portanto, a análise que faço é como artista creditado para observar esta obra. A encenação em questão, dirigida por Luis Artur Nunes, é do grupo “Teatro sim... por que não?!!!” para os contos de Nelson Rodrigues, publicados no jornal A última hora no final dos anos 50 no Rio de Janeiro. Em torno de dois anos atrás alguém pretensiosamente me ironizou dizendo que quem escreveu as Comédias da vida privada foi Luís Fernando Veríssimo e não Nelson Rodrigues. Hoje, depois de ter assistido essa montagem do excelente grupo do nosso estado vizinho, saí convicto de que os contos da obra A vida como ela é, como eu já havia percebido, são também uma comédia da vida privada (claro que nada a ver com a do Veríssimo). “Comédia grostesca, amarga mas inegavelmente comédia” como declara Luís Artur no programa da peça. É medíocre demais pensar que para teatralizar Nelson precisamos mergulhar somente nas mesmas fontes, em pesquisas fundamentadas em filmes eróticos das décadas de 60 e 70 baseadas nas obras de Nelson ou ainda em qualquer referência óbvia sobre tudo que artisticamente já foi realizado sobre suas obras. Nunes, preservando categoricamente o texto, com sensível percepção, nos apresenta a comicidade intrínseca sim nesta dramaturgia. É a visão da liberdade do artista, assim, sem pudor, sem medo, sem rótulos, sem pré-conceitos e o melhor, sem a preocupação de querer agradar. O que vimos é uma encenação de grande teatralidade legitimando um dos maiores encenadores deste pais. Os contos seguem todos a mesma linha de recursos cênicos fazendo das cinco histórias uma peça. Os figurinos remetem aos anos 50 mas com graça e colorido vigorosos. Os biombos do cenário trazem impressões dos jornais da época e ainda nos surpreendem, ao final de quatro dos contos, com gravuras iluminadas alusivas ao conto em questão. A ousadia de Nunes e do talentoso elenco é sim cheia de exageros, caras, bocas, sobrancelhas, e marcas rígidas. Tudo perfeitamente natural. E aí tudo se mistura, os atores ora narram, ora encarnam os personagens, uns manipulam outros como se fossem bonecos (como um autor direcionando seus personagens) e ainda dublam-se entre si. As máscaras usadas em três dos contos nos passam a sensação de que somos todos iguais. A trilha sonora e a iluminação são impecáveis seguindo a proposta de teatralidade da encenação. No final da apresentação o público aplaude de pé com entusiasmo. No 18° Porto Alegre Em Cena, Luis Artur e o grupo de Florianópolis agradam a quem merece ser agradado, o público! Meus agradecimentos ao festival e ao Marcelo Adams pelo convite e confiança!
* Paulo Adriane é ator
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