No me olvides: Carlos Villalba y Orquestra Veláskez*
“Carlitos” Villalba, como é carinhosamente chamado, é uma figura conhecida da classe artística porto-alegrense. Muito querido por todos, arrisco dizer que ele deve ter escovas de dentes espalhadas na casa de uns quantos amigos na cidade. Mas, o que pouca gente sabe é que o grande produtor é também o compositor de belas canções, além de cantor e letrista sensível, que lançou recentemente seu primeiro disco, intitulado No me olvides.
O que assistimos no Teatro Renascença, dias 17 e 18, foi o Villalba cantor e compositor, amparado por uma orquestra impecável combinando piano, contrabaixo, guitarras, percussão e bateria, com um quarteto de cordas (2 violinos, viola e violoncelo), clarinete, clarone e sax soprano. Tal sonoridade “mezzo erudita” vestiu as músicas de classe e bom gosto, com os ótimos arranjos do diretor musical Diego Schissi, que comandava o grupo desde o piano. Como se sabe, não basta reunir alguns violinos e achar que vai soar lindo! É preciso um arranjo bem escrito e executado. Temos que tirar o chapéu para a excelência musical dos hermanos argentinos (assim como também dos uruguaios), os quais têm tradição de bons músicos de orquestra, e por anos formaram o grosso do contingente da nossa Orquestra Sinfônica de Porto Alegre.
A música de Carlitos soa requintada sem soar difícil. Construída sobre harmonias etéreas, trilha caminhos incomuns, com acordes “abertos” e cadências que não conduzem ao chão, mas mantem o ouvinte suspenso, enquanto o canto aveludado passeia por melodias lânguidas, por vezes próximas do recitativo. Passa uma sensação de contemplação e serenidade, com elementos de musica de câmara, cool jazz e folclore. Ao final, quando comentei com uma amiga em quem confio no bom gosto, sobre a atmosfera linear e contemplativa das músicas, ela prontamente respondeu que essa tinha sido justamente uma das melhores qualidades do show, pois não haviam grandes arroubos, crescendos ou explosões repentinas que alterassem subitamente o ânimo do ouvinte.
As letras das canções, repletas de imagens poéticas e projetadas ao fundo em suaves movimentos, auxiliaram a compreensão do texto e serviram como ambientação de cenário, explicitando sua declarada paixão pela literatura.
A falta da diva argentina Liliana Herrero, cuja participação estava anunciada, foi imediatamente preenchida à altura com a participação surpresa de outra diva, sempre competente e exuberante: Cida Moreira cantou demais, e soube colocar-se à disposição da música de Villalba, timbrando sua voz com a dele, com a sabedoria e a generosidade que só se vê em grandes artistas. E se a afinação do cantor foi imprecisa aqui ou ali, sua voz macia e aveludada compensou em expressividade e intenção que só o autor sabe dar as suas canções.
A leveza do show ficou por conta da simpatia e do humor refinado de Villalba, que soube cativar o público brincando e rindo de si mesmo, na condição de “estreante”, e rendendo homenagens ao pianista gaúcho Geraldo Flach e à cantora Shakira, na música mais pop do show, que foi apresentada três vezes em diferentes versões “na esperança de que vire um hit”. A plateia, que estava repleta de músicos, atores e produtores culturais, aplaudiu em pé ao final, demonstrando ter gostado do que viu e ouviu. Eu estava entre eles, e também gostei.
* Marcelo Delacroix é músico e compositor
Um comentário:
É outra coisa quando um músico escreve sobre música. Eu, que não sou da área mas costumo cometer textos a respeito, reconheço tranquilamente.
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