quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Molly Bloom por Marcelo Mertins


Molly Bloom é o último capítulo do aclamado romance Ulisses, do escritor irlandês James Joyce, que ganha vida na voz de Cristina Banegas. A premiada atriz portenha celebra seus 45 anos de teatro com o desafio de contar uma história que se passa no plano da mente, no fluxo do pensamento de uma mulher em uma noite de insônia. Molly Bloom é a nudez da mente feminina exposta ao espectador vouyer. Esta mulher - uma avessa a Penélope da Odisseia de Homero (obra que inspira Joyce) -  está em sua cama ao lado do marido Leopold Boom, que dorme enquanto ela é arrebatada por sua própria consciência.
A encenação é composta apenas pela atriz frente a um pedestal de partitura. Utilizando essencialmente a voz, por uma hora Cristina nos leva ao quarto de Molly. Em sua cama, ela simplesmente flui com uma sinceridade arrebatadora. Sem pudor ela fala sobre suas fantasias, desejos, traições, amores e teorias sobre os homens. O monólogo é uma transcrição do pensamento, então ele jorra ritmos e texturas musicas. É como uma partitura, uma música cantada  por uma atriz plena em sua arte de contar histórias.
Já foi dito que todo ato de comunicação é um ato de tradução. Traduzir Joyce para o teatro é um projeto antigo e pessoal da atriz, que 12 anos depois de tentar montar o texto pela primeira vez, vê a obra tornar-se domínio público, obtendo enfim os direitos da montagem. Mas traduzir Molly Bloom ao português, também não é uma tarefa fácil. A velocidade do texto e a riqueza do trabalho podem fazer com que o espectador deseje que espetáculo tenha legenda. Por ser praticamente uma leitura dramática, a assimilação e apreciação do espetáculo está totalmente dependente da compreensão da língua espanhola.
A direção é de Carmen Baliero, musicista com longo trabalho de composição para o teatro. Seu trabalho é nitidamente percebido pelo cuidado com a palavra que se transforma em música. A leitura parece um concerto em que a atriz brinca com as nuances de sua voz e de sua emoção, enquanto o público observa excitado uma mulher despir-se de toda a sociedade.
Molly Bloom é uma celebração da palavra, da mente, da intimidade, e acima de tudo, do feminino.
 
*Marcelo Mertins é ator

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