Solidão,
limite, extremo, envelhecimento, são temas que permeiam o trabalho de Ido
Tadmor, premiado bailarino israelense que traz um trabalho consistente, atual e universal ao 19º Porto Alegre em Cena.
Tadmor é um artista contemporâneo por natureza. Um bailarino que cria, pesquisa
e interpreta suas obras expondo suas questões
através de gestos limpos, inusitados e extremamente plásticos. Seu espetáculo é composto por quatro trabalhos
distintos, entretanto conectados. Aos poucos, vamos entrando no seu universo e, aficcionados, ficando cada vez
mais curiosos para entender seus motivos. Mesmo que seu trabalho, carregado de
marcas e significados, não necessite explicação. Tratando de temas extremamente
comuns a todo ser humano, esta obra aberta como um todo apresenta uma série de
imagens criativas e inusitadas que permitem a cada espectador diferentes
possibilidades de identificação.
A
primeira obra, mostra um homem sozinho em um quarto escuro, lidando com seus
limites corporais e questões psíquicas. Um solo que propõe uma série de
soluções interessantes em deslocamentos pelo espaço e formas de lidar com o
próprio corpo. Como cada um faz para lidar consigo mesmo? Em um segundo
momento, temos um casal que fala uma língua estranha e gesticula, ora
interpretando, ora lidando com questões da relação. De um com o outro. De ambos
com o espaço, com seu próprio corpo. O estranhamento inicial; desta “nova cena”
gradativamente dá espaço a um afeto muito grande por este casal de pessoas
reais que enfrenta mudanças e o envelhecimento. Este homem é o mesmo do início?
A sala é parte da mesma casa daquele quarto inicial? Não temos certeza e, assim
mesmo, nos deixamos levar por uma trajetória muito similar a que vivemos em
nosso cotidiano. No trabalho seguinte voltamos a nos defrontar com um homem só.
Lidando com uma história corporal ampla e diversa, em paz com suas marcas. É
possível detectar traços de um formalismo do ballet, ou de coreógrafos como Béjart,
Forsythe, entre outros. E torna-se inevitável a busca por relações com aquele
primeiro homem só. A habilidade corporal deste bailarino versátil, agora apresentada em um conjunto de gestos
formais do ballet, se funde ao limite corporal explorado inicialmente, um
limite que beira a deficiência se confunde a uma habilidade que pode causar uma
espécie de estranheza muito parecida àquela de um homem lidando com seu corpo e
suas diversas possibilidades. De forma
extremamente contemporânea, Ido está em paz com os traços permanentes de
séculos de história da dança em sua própria estória. É uma satisfação imensa
ver um bailarino que domina diferentes tensões, linguagens ou dinâmicas. Um
bailarino presente em cada instante de seu trabalho. Seja num momento
formalmente coreografado ou em outros, de pesquisa e procura por uma dramaturgia
que nos permite questionar quem é este ser que se move frente a nós. E que se
move de forma cuidadosa e minuciosa. Cada gesto, detalhe, é meticulosamente
planejado. Assim como o trabalho de luz, cenografia e figurino. Seus gestos vão
se transformando e nossa impressão sobre o trabalho, também. Finalmente, vemos este criador em outro solo
onde uma trajetória é completada e percebemos que estamos diante de um artista que, apesar de preso em suas
questões, transita livremente dentre seus conflitos. Um artista que fala diretamente
ao ser humano. Esteja ele sozinho ou acompanhado, em Israel, Brasil, ou em um
quarto escuro.
*Silvia Woolf é bailarina e professora da Licenciatura em Dança da Ufpel
Um comentário:
Silvia, parabéns pelo texto. Concordo muitíssimo com tuas questões. E, claro, parabéns ao Ido!
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