sábado, 18 de setembro de 2010

Artur José Pinto: Antígonas


Foto: Guilherme Santos / PMPA

Antígonas


"Deixa-me sofrer o tremendo castigo de minha temeridade! Por muito que eu sofra, nunca serei privada de uma bela morte." Sófocles - Antígona , I, 20


Advirto que, os pecados cometidos contra o estilo se devem ao fato de que cumpro, no mundo, o papel de "fazedor" e não de "criticador" teatral. Todavia, recebi o convite do Rodrigo Monteiro como um agradável desafio. Então, lá vai.

Ao intitular o espetáculo, o encenador abre a porta para uma inevitável comparação com a Antígona de Sófocles, a terceira parte da trilogia tebana. No original, Antígona, filha de Édipo e de Jocasta, desafia seu tio, Creonte, rei de Tebas, quando esse ordena que o corpo de Polinice jaza insepulto. Polinice é irmão de Antígona, junto com Etéocles e Ismênia. Ao afrontar Creonte, na tentativa de tirar-lhe o trono, Polinice foi condenado a ter seu corpo servido de pasto aos animais e à corrosão do tempo, a fim de que sua alma jamais descesse ao Hades. Desesperada, Antígona ignorou as ameaças do tio e realizou, por duas vezes, a cerimônia fúnebre do irmão. Enfurecido, Creonte condena Antigona a morrer emparedada, ignorando os apelos da mulher, do filho e dos sábios. Arrependido, o rei tarda em tentar livrar Antígona de sua sentença. Encontra-a enforcada. Antes de cometer os atos que levaram a sua condenação, Antígona foi confrontada por Ismênia, que ponderava as consequências do comportamento da irmã.

São quatro, as Antígonas de Alberto Muñoz. E, também, quatro Ismênias. Em quatro textos independentes, vemos as duas personagens residirem, juntas, na mesma alma. As inquietações, as necessidades, os sonhos, as buscas de um espírito múltiplo, complexo e sensível. Que trava batalhas internas, que pondera, que conspira e que, em alguns caso, se resigna. Resigna-se, inclusive, a perecer, como o caso de personagem de Sófocles, por seus sentimentos de compaixão, por sua defesa da família.

A direção de Leonor Manso é cuidadosa com a narrativa, precisa, essencial. Sua concepção do espetáculo reforça a mão do autor para a poesia. Sem descuidar do tema, vale-se do humor, bem-vindo, na dose certa.

O figurino de Elsa Berta Keller, de cor neutra, vale-se de acessórios para imprimir a alternância das personagens.

A luz do espetáculo, de Pedro Zambrelli, é competente. Colabora com a narrativa, ao estabelecer os pontos essenciais da cena. Utiliza, por vezes, matizes violáceas, azuis, para esfriar as cenas, alternando com gerais e pontos de luz clara para imprimir energia. No início da cena da aula de canto, ilumina somente rosto da personagem que entra, com absoluta precisão de marca.

O trabalho das atrizes - Ingrid Pelicori e Claudia Tomas é precioso. Ambas tem domínio da técnica. A projeção das vozes é perfeita. O ritmo, a simetria, a clareza das atuações convidam o público a acompanhá-las, com prazer. Alternam emoções com precisão e delicadeza. Isso faz com que se estabeleça a unidade do espetáculo, embora se trate de quatro episódios distintos.

O som é, igualmente, competente. A trilha e as músicas especialmente compostas dão o clima apropriado à narrativa. a trilha incidental estabelece, principalmente nas trocas de cena, uma "cama" de sons graves e envolventes. A canção executada à capela tem a propriedade de criar todo o cenário invisível, onde aquelas personagens vivem.

A solução do cenário é simples e criativa. Uma "gangorra" reforça a idéia de altos e baixos. Serve de maca, de banco, de barco. Embora bem executadas, as trocas de posição da "gangorra" poderiam ter outra marcação. Por questão particular de estilo, entendo como excessivos os back-outs, em cada troca.

Quando terminou a sessão, tive a impressão de estar saindo de um espetáculo de antigamente. Dos anos 1970. Em termos estéticos, utiliza fórmulas conhecidas. Todavia, isso não invalida a sua qualidade. Novidade é quando vemos o velho ser bem feito.

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Texto: Alberto Muñoz / Direção: Leonor Manso / Elenco: Ingrid Pelicori e Claudia Tomás / Figurino: Elsa Keller Amanda Carvalho / Cenário: Leonor Manso / Iluminação e Trilha sonora: Pedro Zambrelli / Música: Alberto Muñoz e Diego Vila / Canção original: “Bye Bye Maciel”/ Piano: Diego Vila / Produção: Carolina Cacciabue / Realização: A & B Realizaciones Escenográficas / Duração: 1h / Classificação: livre

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Artur José Pinto é ator, dramaturgo, roteirista e diretor teatral.

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