quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Guilherme Nervo: o encerramento
Foto: Guilherme Santos
O vigésimo e último dia de encanto
Até mesmo o prefeito, José Fortunati, compareceu à entrega do 5° Prêmio Braskem Em Cena. A participação já havia sido pré-estabelecida, porém não surpreenderia se não houvesse sido, pois a quantidade de pessoas que entraram no Theatro São Pedro era inacreditável. Quando, enfim, todos estavam acomodados, visualizamos em uma tela de fundo a projeção de um vídeo que apresentava as peças locais concorrentes às cinco premiações. Contamos com a ambientação de uma música animadíssima, que remetia ao circo e à Fellini. Os concorrentes foram:
- Dentrofora (teatro)
- Dar carne à memória (dança)
- Elefantilt (teatro)
- Milkshakespeare (teatro)
- My house (dança)
- O avarento (teatro)
- Homem que não vive da glória do passado (teatro)
- O Gordo e o Magro vão para o céu (teatro)
- Play-Beckett (dança e teatro)
- Solos trágicos (teatro)
Após cada mini demonstração das peças, a diretora ou o diretor comentava a respeito do Troféu Braskem e do financiamento dado à realização do Porto Alegre Em Cena pela empresa. O que se viu foi uma idolatria efusiva. Imagem esta confirmada com as diversas referências à empresa e com os holofotes que infestaram o teto do teatro: Braskem, Braskem, Braskem. O fato de uma empresa petroquímica de capital privado investir largamente em cultura é simplesmente bárbaro, entretanto, a postura de subordinado/dependente não deve cair no exagero.
Para quebrar com o clima solene da cerimônia, Luciano Alabarse conduziu a entrega de prêmios com seu típico humor elegante: admitiu não saber como funciona uma média harmônica (por mais que seu amigo Roger Lerina tente explicar), comentou sobre a gafe que lhe foi enviada de São Paulo (o “Porto Alegre em Ação”) e nem quis saber como é dada a formação do polietileno, ao trocar palavras com João Rui Dorneles Freire (diretor de marketing da Braskem), que entregou a primeira premiação da noite. Marco Rodrigues ganhou o prêmio de Melhor Espetáculo pelo Júri Popular por seu espetáculo de dança My house. Segundo o Júri Oficial, estes foram os vencedores:
Melhor Atriz / Bailarina – Fernanda Petit, por Solos trágicos
Melhor Ator / Bailarino – Eduardo Severino, de Dar carne à memória
Melhor Diretor / Coreógrafo – Carlos Ramiro, de Dentrofora
Melhor Espetáculo – Dentrofora
O Melhor Espetáculo ganha, além do troféu, 20 mil reais. O restante, ganha três mil reais. Vale salientar que um festival com 70 atrações apresentadas em 20 dias parece ser coisa de louco, mas a eficiente classe artística deu conta da façanha! O 17º Porto Alegre em Cena foi realizado pela Prefeitura, com a parceria das empresas Petrobrás, Braskem e NET, mais a Caixa, a Multiplan – Barra Shopping Sul e a Cia Zaffari.
Para finalizar, é imprescindível dizer que a premiação foi toda fragmentada, visando encantar o público ansioso com o glamour decadente de Cabarecht, o espetáculo musical de Humberto Vieira. Cida Moreira penetrou o breu em um palco composto por duas mesinhas e um piano de cauda negro, cintilante. Neste sentou e de lá não saiu mais. Trajava um vestido enorme, com uma parte interna em formas geométricas esverdeadas que era um charme. Não só grande mulher, como também grande diretora musical, Cida toca com estilo. Em seguida, entrou Antônio Carlos Brunet, figura que se destacava pela blusa vermelha e pela lindíssima voz, provavelmente de tenor. Inclusive, as vozes masculinas me chamaram mais atenção do que as femininas nesta montagem soturna que revisita os antigos cabarés alemães.
Aqui, explora-se a obra do dramaturgo alemão Bertolt Brecht. É uma reunião de intelectuais a fim de mostrar o seu talento através das audaciosas músicas do compositor Kurt Weill, criadas com o apoio de Brecht. Zé Adão Barbosa entrou com o corpo engajado e refinados trejeitos, compartilhando conosco e com seus parceiros a potencialidade de sua voz de declamador de poesias, contador de histórias. A junção de timbres se deu por completa quando a esvoaçante Sandra Dani chegou ao microfone com pérolas e a energia de uma jovem mulher. Jovem mulher sensual! É a liberdade existente apenas no teatro. Logo mais ela cantou Surabaya Johnny mergulhada em desilusão amorosa, priorizando a interpretação ao invés da melodia, algo que se repetiu até o fim de Cabarecht.
Os homens nos presentearam com uma empolgante versão de A balada da dependência sexual, ao passo que Cida Moreira deu o melhor de si em uma versão extremamente espirituosa de Teresinha. A temática da peça me fez imediatamente reviver os momentos de Quanto vale ou é por quilo?, musical do qual fiz parte no início desse ano. Ernani Poeta conduziu uma linha narrativa voltada ao tráfico de pessoas, com as personagens de Brecht e as músicas de Weill. Esse foi apenas mais um atrativo para assistir à peça em questão.
A maquiagem utilizada no rosto dos atores e atrizes é carregada: uma base de pancake branco com traços negros ressalta os traços e dá a eles um aspecto vampiresco. Também presenciamos Mack The Knife, com a famosa balada revisitada por Chico Buarque em O Malandro. A despedida, não só de Cabarecht como do 17° Porto Alegre Em Cena, foi consumada com o embriagante país dos nossos desejos: Youkali. Pena que a versão francesa cantada pelo quarteto, ainda que bela, nos prive da tradução.
Pois aqui coloco alguns trechos dela:
[...]
Youkali, é o país dos nossos desejos
Youkali é a felicidade, é o prazer...
Youkali é a terra onde esquecemos os nossos cuidados...
é, na nossa noite, como o alvorecer,
a estrela que seguimos é Youkali!
*
Guilherme Nervo é crítico de teatro do site www.poashow.com.br
Marcadores:
Cabarecht,
Encerramento,
Guilherme Nervo,
Prêmio Braskem
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário