quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Felipe Mônaco: In on it


Foto: Guilherme Santos / PMPA

A boa peça e o espetáculo de horror

Desde o início, fica evidente o desejo do diretor Enrique Diaz de realmente dialogar com o público. Esse desejo é expresso pelos atores através das constantes perguntas e afirmações dirigidas à plateia. Não são perguntas retóricas e nem piadinhas simples para animar o público. São perguntas sinceras e afirmações do tipo: “Isso é uma peça, não é um espetáculo”.

E realmente é uma peça. Viva, aberta e caótica. Não há cenário além de duas cadeiras, não há tempo linear e tão pouco há uma história fechada. E essa é a essência do diálogo, pois nela está a possibilidade de cada uma das pessoas na plateia compor a sua versão da peça. O que se vê são dois atores maduros e excelentes transitando entre três realidades distintas. Que se combinam para falar de amor, relacionamentos, tentativas, (inclusive a tentativa de montar uma peça) do acaso, de mudanças e o inevitável fim de tudo.

O trabalho dos atores é impecável. Sua noção de ritmo, a clareza na dicção, a consciência do que é estar em cena sem exageros, o carisma com o público, a agilidade para explorar cada nuance das emoções oferecidas pelo texto, demonstra realmente dois atores experientes e muito bem escolhidos para a proposta. Percebe-se uma engrenagem bem lubrificada funcionando em harmonia, não há excessos no jogo dos atores.

A direção de Henrique Diaz é ágil, simples e eficiente. As mudanças de cena são claras e muito bem marcadas tanto pela atuação dos atores, quanto pelas precisas mudanças de iluminação no trabalho de Maneco Quinderé. É clara também a paixão de Diaz pelo teatro dentro do teatro, uma constante em sua trajetória. Que a cada trabalho da Cia de Atores se intensifica criando mais níveis, mais universos paralelos intrincados. Até o momento incrível em que a vida dos atores se mistura com a vida das personagens.

Mas, infelizmente, o que mais chamou a atenção, principalmente, no início da peça, foi a falta de educação e a histeria de algumas pessoas na plateia. Eu não entendo como, nos dias de hoje, ainda é possível uma pessoa deixar o celular ligado durante uma peça. Isso está além da falta de educação, é puro desdém pelos atores e pelo público. E essa pessoa atenderia o celular pra dizer o que? “Hã... Desculpe, não posso falar agora... Estou no teatro... Me liga mais tarde”.

Por duas ou três vezes, celulares tocaram em menos de 15 minutos de peça. Um desses “gênios” ainda conseguiu sair do camarote pra atender e bateu a porta bem alto. E teve início a ópera do mau gosto: o eterno abrir e fechar de bolsas, o crepitar insuportável dos saquinhos de bala, o brilho debilóide das telas de celular enquanto algumas pessoas mandavam e recebiam suas mensagens irrelevantes: “O q VC vai Fzr Dpois?”. Ou simplesmente viam as horas. Que diferença faz que horas são? As risadas mais altas que a fala dos atores e totalmente fora de hora. Aquele tipo de risada histérica que não é uma expressão de graça, mas, sim, uma mensagem aos outros: “eu sou culto, eu sou pós-alguma coisa, entendo todas as piadas de peça antes mesmo dos atores terminarem de falar...”

São essas as pessoas que acordam às cinco horas da manhã para comprar ingressos? Para quê, pra fazer isso? O que está acontecendo? Onde está a educação, a consciência e o respeito pelo próximo? O mais irônico é que, quando os atores falavam com a plateia, ela ficava muda, atônita, sem reação. Vai entender...

*

Felipe Mônaco é ator e recentemente se aventurou como diretor e autor da peça Fora do ar. Formado pelo Tepa em 1999 divide sua carreira igualmente entre o teatro, cinema e tevevisão. Em Porto Alegre, trabalhou ao lado de Jorge Furtado, Mirna Spritzer, Marco Fronchetti, Heinz Limaverde e Patsy Cecato. No Rio de Janeiro participou da Companhia Atores de Laura dirigida por Daniel Herz.

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