quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Luciano Alabarse: O ano do pensamento mágico


Foto: Ivo Gonaçalvez /PMPA

O ano do pensamento mágico

De todos os gêneros teatrais, o monólogo, ao ser levado para o palco, é o que apresenta o maior número de desafios cênicos em função de sua estrutura essencialmente narrativa. Esse é o primeiro e o mais relevante de todos os aspectos teatrais a serem considerados por uma equipe quando decidem encenar um monólogo. Ao ator ou atriz encarregado de dar voz ao personagem, se pede preparo, técnica e emoção para que o projeto não mergulhe numa apatia didática que pode aborrecer em demasia o público.

A montagem brasileira de O ano do pensamento mágico vence, satisfatoriamente, a maioria dos seus obstáculos. O texto da escritora Joan Didion que, em outros países, foi montado com atrizes do quilate de Vanessa Redgrave, encontra em Imara Reis uma atriz preparada para a empreitada. Ao iniciar sua espécie de palestra/entrevista, encontramos uma mulher a confidenciar seus sentimentos e reflexões diante da perda do marido e da filha, em um período de tempo relativamente curto entre essas duas mortes difíceis. O trabalho de atriz não pode resvalar para um pieguismo melodramático em momento algum. Ao mesmo tempo, não pode se subtrair ao impacto do que causam essas perdas dolorosas. Imara Reis mostra pleno domínio do seu ofício e constrói uma personagem convincente e sincera, roçando a pura emoção e vencendo o mero relato que a situação propõe. Seu trabalho é o centro condutor do espetáculo e não poderia ser diferente. Tudo o mais recua para um segundo plano. A iluminação e o cenário são bastante simples e não causam maior impacto. Visualmente despojado, o palco é todo de Imara e a atriz aproveita para mostrar as nuances dos sentimentos da personagem.

O público parece acompanhar, hipnotizado, o seu relato. Não se ouve um ruído na plateia, ninguém se mexe, ninguém tosse, não toca nenhum celular. Quando a peça termina, estamos todos mais conscientes da finitude da vida e da passagem inexorável do tempo, imantados ao trabalho da grande atriz, que mereceu, um a um, todos os aplausos de pé que recebeu do público gaúcho.

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De: Joan Didion / Tradução: Érica de Almeida Rego Migon e Ursula de Almeida Rego Migon / Direção e Dramaturgia: Caio de Andrade / Interpretação: Imara Reis / Figurino e Cenário: Célia Alves / Iluminação: Jukyara Felipe / Trilha sonora: Caio de Andrade / Direção de produção: Luque Daltrozo / Realização: Daltrozo Produções Ltda / Duração: 1h / Classificação: 14 anos

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Luciano Alabarse é diretor de teatro e coordenador do Festival Porto Alegre em Cena.

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