quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Zé Adão Barbosa: Sandra Dani


Foto: Mariano Czarnobai / PMPA

A homenageada


Conheci Sandra no início dos anos 80. Fazia uma peça infantil com o Carlos Carvalho, A viagem de um barquinho (eu fazia o barquinho, acreditem) e, através da Araci Esteves, fui apresentado a ela. Ainda tinha na lembrança a imagem dela como Dona Margarida, depois cantando Surabaya Johnny, em Salão Grená, uma imagem que marcou meu início de carreira. Na plateia, ficava extasiado diante daquela mulher no palco, com aqueles olhos verdes faiscantes, aquela voz grave, aquele gestual forte. Logo depois, ela e o Luiz Paulo foram morar nos Estados Unidos e eu não consegui conhecê-la pessoalmente. Quando voltou ao Brasil, eu fazia a peça com o Carlinhos e, em um evento na Biblioteca Pública, vejo Araci Esteves ao lado dela: Sandra Dani. Quando nos apresentamos, eu fiquei de pernas bambas e ela sorria com aquela animação de sempre. Começou ali. (Ela conta que lembra até hoje da roupa que eu usava.)

Acabamos nos falando sempre, com uma simpatia mútua que já prenunciava uma grande amizade. Quando Luiz Paulo Vasconcellos dirigiu A gaivota, do Tchekov, eu fiz o Treplev e, adivinhem? Sandra fazia Arkádina, minha mãe. Foi uma paixão avassaladora, fomos filho e mãe durante toda a temporada. Depois, em Hendenplatz, mais uma vez: mãe e filho. Entrávamos nos últimos 15 minutos do espetáculo, ficávamos no camarim tagarelando até os minutos que antecediam nossa entrada. Aí, começávamos um diálogo improvisado como a mãe e o filho da peça, falando mal dos parentes que nos esperavam pra reunião familiar. No final, quando ela tombava morta sobre os pratos, na frente de toda a família, eu pensava: que privilégio poder ver esta diva atuando na minha frente, com esta loucura que lhe é peculiar, uma louca apaixonada que se entrega com tal voracidade ao personagem.

Ela nos incendeia. É impossível não se contagiar com aquela energia, aquela alegria de viver, aquela gargalhada maravilhosa. Não me lembro da Sandra se queixando do teatro, do cansaço, dos ensaios. Tudo pra ela é sagrado, desde o aquecimento até o momento em que entra em cena. Isso, quando ela não convence o diretor a ficar no palco durante toda a entrada do público gemendo e chorando em cena como em Medeia.

Na verdade, não penso nela como mãe até porque temos quase a mesma idade. Ela é minha amiga, minha irmã, minha confidente, minha grande parceira de cena, com quem ainda vou dividir o palco em dezenas de outros trabalhos.

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Zé Adão Barbosa será homenageado no 18º Porto Alegre em Cena com a edição do livro Gaúchos Em Cena volume 2.

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