domingo, 26 de setembro de 2010
Liane Venturella: Reglas, usos y costumbres
Foto: Mariano Czarnobai / PMPA
Reglas, usos y costumbres en la sociedad moderna
Um dos autores contemporâneos mais montados na França, Jean-Luc Lagarce teve suas obras traduzidas em diversos idiomas. Sua experiência nas diferentes áreas do teatro talvez explique o êxito de seus textos, o refinamento de seu humor e a sensibilidade em expor as relações humanas. Entre as vinte e cinco peças de teatro deixadas pelo autor destacam-se clássicos como Music Hall, Apenas o fim do mundo e Eu estava em minha casa e esperava que a chuva chegasse.
A mera leitura de Regras, Usos e Costumes na Sociedade Moderna de Lagarce já garantiria por si só boas risadas e colocariam o leitor em posição de análise crítica de nossa sociedade. Esse efeito é obtido pelo contraste entre a amplitude e a profundidade dos momentos de celebração da vida (dividida entre nascimento, batismo, casamento, bodas de prata, ouro e morte) aludidos e sua representação absurdamente resumida sob a forma de regras que supostamente nos auxiliariam a vivenciar de maneira adequada cada uma dessas etapas.
Com boa expectativa, fui assistir à montagem desse texto realizada pelo diretor espanhol Ernesto Calvo. Todos nós, público e equipe do espetáculo, tivemos o azar de vivenciar um acidente: ocorreu um corte de energia nos dez primeiros minutos da peça, que prosseguiu até o final do espetáculo. O que posso comentar baseia-se, pois, em uma experiência marcada por condições adversas, muito particulares e idiossincráticas.
O espetáculo, com atuação de Gerardo Begérez, revela, desde o inicio, um ator de bom potencial tramando uma concepção que não conseguiu ser clara quanto às suas intenções: ou bem se propunha uma comédia sem muitos risos, ou uma bem alguma outra leitura cujo teor permaneceu oculto do público. O texto de Lagarce é aberto para inúmeras possibilidades de encenação como o exemplificam as três montagens que serão apresentadas na França ao longo de 2010. O caminho seguido pelo diretor, optando por um ator simplesmente figurinado e representando uma dama inspirada na baronesa Blanche Staffe, aponta pra possibilidades que não foram inteiramente desenvolvidas. Tudo permanece na promessa, tudo é "quase", a começar pela figura narradora das ditas regras. E, nessa peça em particular (concebida na forma de um monólogo), "quase" fazer a personagem acaba por ser o mesmo do que não fazê-la e não “ganhar” o público.
Com o inesperado e abruto incidente da falta de luz, toda iluminação da peça ficou naturalmente prejudicada, bem como eventual trilha sonora. O ator, por sua vez, diante da insólita situação, decidiu por manter o ritmo do espetáculo como se nada tivesse acontecido. Lamentei a aparente indiferença com que o ele viveu a situação diante da presença de uma plateia tão amigável. Se sua atitude revela grande profissionalismo diante da falta de condições técnicas mínimas, ela, porém, não lhe permitiu tirar proveito da oportunidade de improvisação e da cumplicidade que poderia ter sido buscada com o público, submetido a uma circunstância tão - ou mais - bizarra. Um monólogo com tão pouco apoio de cenário, de luz e som, é uma situação extremamente delicada que exige do ator maturidade e experiência.
Assim, por razões alheias, o espetáculo, permaneceu no quase, na promessa... Mas seus momentos iniciais e o desempenho do ator deixaram a plateia com a suspeita de que não foi dessa vez que a dupla Ernesto Calvo e Gerardo Begérez logrou nos brindar com um Lagarce à altura de seus talentos.
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LianeVenturella é atriz e produtora teatral. Atuou em mais de trinta espetáculos e em nove filmes. Formada pela Desmond Jones School of Mime and Phisical Theatre, também estudou com Ronald Wilson (1991), Lorna Marshall (1992), Joff Shaffer (1996) e na École Philippe Gaulier, em Londres. Iniciou a carreira em 1984, no Grupo Mutirão. Entre seus principais trabalhos, estão A bela adormecida (Quero-Quero/ Sated de Melhor Atriz Coadjuvante de 1984); Decameron (1994), da Cia Stravaganza; Auto da compadecida (Açorianos de Melhor atriz coadjuvante de 2001), do Grupo Depósito de Teatro; Toda nudez será castigada (2001), da Cia. Teatro Estudio; Aquelas duas (2003) e Calamidade (Açorianos de Melhor Atriz de 2006). Atualmente participa da Cia. In.Co.Mo.De-Te, em que dirigiu O Gordo e o Magro vão para o céu (2008) e atua em Dentrofora (2009), estes últimos participantes do 17º Porto Alegre em Cena.
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