quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Luiz Paulo Vasconcellos: Happy days


Dias nem tão felizes assim...

A imposição de uma estética de encenação, por melhor que esta seja, a uma obra dramática, nem sempre resulta num bom espetáculo. Às vezes, pode resultar num desastre. Que outros críticos, talvez por polidez, diriam tratar-se de um equívoco. Não importa. Equívoco ou desastre, este é o resultado da direção de Bob Wilson da peça de Samuel Beckett, Happy days. Um espetáculo inerte, repetitivo, sem uma linha dramática ascendente que sustente minimamente o interesse do espectador durante a hora e meia de duração. Em suma, um espetáculo chato.

Mesmo a iluminação, que tem sido um dos mais requintados recursos cênicos utilizados pelo diretor, não atinge o nível dos espetáculos anteriores. O que vimos ontem no Theatro São Pedro foi uma luz ácida, agressiva, tentando desesperadamente se impor acima e além do que acontecia no palco, uma espécie de tábua de salvação diante de um afogamento iminente.

Beckett foi um autor que, conscientemente, deixou-se influenciar pelas diversas experiências narrativas que o melhor teatro que o antecedeu legou a ele e a nós – o naturalismo, o trágico, o melodrama e a farsa. Em Fim de jogo, por exemplo, ele faz o trágico e o absurdo conviverem com o comportamento farsesco dos personagens. Em Esperando Godot, a inação é transformada em ação teatral e sublinhada por um diálogo cujo estilo lembra o dos melhores comediantes do cinema mudo. No caso de Happy days, o que sustenta a obra é a oposição entre o absurdo da situação – uma mulher enterrada até a cintura no primeiro ato e até o pescoço no segundo – com o naturalismo da representação. Winnie é essencialmente humana em seu longo monólogo que externa as suas dúvidas, os seus desejos mais íntimos, suas desilusões, sua tristeza e sua alegria. Com um revólver ao alcance da mão ela inicia o primeiro ato falando sobre a felicidade da vida, sobre o belo dia que terá pela frente. No segundo ato, quando o uso do revólver se torna uma possibilidade, ela já não tem mais domínio sobre o uso das mãos, enterrada que está até o pescoço. Mas a iluminação do espetáculo dirigido por Bob Wilson não me permitia vislumbrar a arma, esse elemento cênico tão importante para a compreensão da emoção de Winnie. Pena...

*

Luiz Paulo Vasconcellos - Ator, diretor e dramaturgo. Professor, pesquisador, ensaísta e crítico . Poeta, joalheiro e cozinheiro nas horas vagas.  

Um comentário:

Devaneios disse...

Pois é! Ao ler a crítica de Vasconcelos eu entendi tudo o que senti naquele dia no São Pedro. Cansei, me irritei, se irritaram os meus olhos. Depois de ter pesquisado e estudado o trabalho de Bob Wilson, espereva ver, no espetáculo algo mais. Pena mesmo!

Alda Silveira - Atriz - Graduanda em Teatro - UERGS