Foto: Mariano Czarnobai / PMPA
A cara irônica da verdade
Sou totalmente leiga em questões musicais e, quando soube que o espetáculo a que fui convidada a escrever tratava-se de uma ópera cômica, de imediato, soube também que meu comentário deixaria de enfocar um dos elementos fundamentais da obra, a música.
Na tentativa de compensar, fui, então, para internet em busca de informações sobre As sete caras da verdade e lá encontrei uma entrevista com um de seus criadores e diretor, Nico Nicolaiewsky, em que ele conta que a inspiração para escrever a peça que divertiu a plateia lotada do Theatro São Pedro, nos últimos dias 21 e 22, se deu logo após ter visto um dos filmes da saga de Indiana Jones, o que despertou no músico o desejo de fazer uma obra que combinasse o ritmo de um thriller de aventura com a grandiloquência da ópera.
E, de fato, durante os enxutos 50 minutos do espetáculo, Nicolaiewsky faz uso com propriedade e bom humor de elementos característicos da ópera para a contar a história de um assassinato, cheia de peripécias e toques de nonsense.
Ao abrirem-se as cortinas, um crime: Alencar (Carlos Qareca) é morto a tiros por Rodolfo (Nicolaiewsky). Mas, em seus momentos finais, a vítima confessa um segredo ao pé do ouvido do assassino, segredo este que irá desencadear a trama marcada por confusões, mortes e trocas de identidade.
Além da vítima e seu algoz, um suspeito narrador (Ricardo Barpp) se faz presente em cena, criando um cômico conflito que se anuncia desde o contraste entre a figura longelínea, de voz altiva e roupas brancas deste com o a do soturno e por vezes, confuso, Rodolfo. Adriana Deffenti completa o elenco com a interpretação carismática e caricata da Mulher Tagarela, esposa de Alencar.
Caricatura, aliás, parece ser a tônica da configuração de todos os personagens. Escolha acertada, que fica clara logo nas perucas que remetem imediatamente ao universo dos cartoons, numa composição arrematada pela maquiagem e figurinos. Soube, inclusive, que o libreto da ópera é em forma de história em quadrinhos e, com isso, cheguei a imaginar se essa linguagem não poderia ser mais assumida pela encenação e na caracterização também do coro (formado pelo grupo Expresso 25), que tem uma participação significativa tanto na música, quanto na encenação, criando imagens sonoras e visuais e protagonizando um dos momentos mais irônicos do espetáculo.
Pois, sem dúvida, essa é uma das meritosas caras de As sete caras: a ironia. A Companhia de Ópera Atômica põe em cena o prazer de rir e fazer rir das convenções da ópera, do fazer teatral e, por que não?, da eterna dúvida existencial que podemos entrever nos instantes finais de Rodolfo. “Quem sou eu?”, canta o assassino, e é assassinado.
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Tainah Dadda é diretora teatral, graduada em Teatro pela UFRGS. Dirigiu Desvario e Sobre saltos de Scarpin. Atualmente, faz assistência de direção em Wonderland e o que M. Jackson encontrou por lá, espetáculo do Teatro Sarcáustico que tem estreia marcada para 16 de outubro, no mezanino da Usina do Gasômetro.
Um comentário:
Oi!
Uma errata: Ricardo Barpp é o narrador e o Carlos Qareca é o Alencar.
Abraço!
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