segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Rodrigo Monteiro #6: Los padres terribles

 Foto: Guilherme Santos / PMPA

Teatro: diretor e atores


Outro dia participei de uma discussão sobre dramaturgia e trilha sonora em função do Troféu Açorianos 2010. Para mim, esses dois itens se aproximam enquanto esferas da mesma polêmica: música/texto feito especialmente para a montagem ou já existente antes dela. O costume é só premiar as trilhas sonoras feitas especialmente para os espetáculos. E os textos só são considerados se forem escritos por pessoas da cidade. Não parece estranho? A mim, sim. E afirmo o que penso: quando o escritor escreve o texto e quando o compositor escreve a música, seja lá onde for, em que computador ou piano for, isso não é fazer teatro. É fazer literatura. É fazer música. Ou o figurinista com os tecidos e o cenógrafo com o martelo e o iluminador com a gelatina. Também não fazem teatro, mas, sim, artes visuais, plásticas. Só quem faz teatro é o diretor/coreógrafo e ator/bailarino. Todo o resto ajuda, auxilia, se envolve na produção e são bem-vindos. Mas sou da opinião de que, na hora H, só sobram esses: o diretor e os atores.

Jean Cocteau escreveu Los padres terribles nos anos 30 e tenho a impressão de que ele não previa a existência de Alberto Zimberg e de seus atores uruguaios. Também não do 17º Porto Alegre em Cena infelizmente. O texto, assim como todos os elementos, foram colhidos pela produção para produzir um espetáculo. E Zimberg não apenas pegou o texto e o colocou na boca dos atores, mas o fez do seu jeito, e, nisso, repito uma cantilena que qualquer pessoa de teatro sabe: ao atualizar literatura para o teatro, os sentidos se modificam, pois ganham novas forças.

O mesmo texto numa produção outra seria diferente. O mesmo com as músicas, com as cores, com o desenho da interpretação. Então, vejamos o que está nessa montagem: o melodrama latino.

Emoções over, cores fortes, movimentos rápidos. Os atores variam o tom de voz muito rapidamente, as cores da maquiagem, dos figurinos e do cenário são exploradas ao máximo (rosa, laranja, vinho, verde,...), os movimentos são grandiosos (jogam-se na cama, batem-se, entram e saem, nem sempre com sentido exposto,...). Tudo é carregado e a comédia está nesse ponto: rimos da loucura a que chegou essa família, uma como outra qualquer, mas, agora, vista sob lente de aumento.

Todas as interpretações seguem a mesma ordem num exemplo de coerência que converge a história para o seu centro: o filho de 22 anos vai se casar com amante do próprio pai, para o horror da mãe que ama o filho mais do que qualquer outra mãe, e para a glória da tia que ama o cunhado mais do que qualquer outra cunhada.

Texto, cores, sons talvez já existissem além da narrativa, mas, aqui, sob os olhos de Zimberg e de seus atores, foram postos a convergir e a engrandecer o projeto a que assistimos nesse Festival. Não se trata de Cocteau, não se trata do verde que também é a cor de um blusão meu, nem de uma música que, talvez, eu já tenha ouvido. Mas se trata de Los padres terribles, um espetáculo que faz rir, que agrada e que aumenta o prestígio desse evento tão querido a todos os gaúchos.

E, para terminar, me pergunto se o fato da última cena cansar o espectador seja culpa do dramaturgo ou do diretor. Explico: são três cenas: no quarto dos pais de Miguel (o filho), na casa de Madalena (a noiva) e, novamente, em casa de Miguel. Na segunda cena, tantas coisas acontecem, tantos gritos, brigas, tapas e correria, além do laranja fortíssimo da cama. Pouco sobra para fazer na cena final. O ápice, nesse jeito tão aristotélico que Zimberg optou, vem antes do fim, um pouco antes demais. A última cena, tão boa quanto a primeira, parece se arrastar mais do que deveria em função da sensação de cansaço que sentimos, tanto rimos no momento anterior da história.

Como não costumo levar textos dramáticos para ler nas plateias de teatro, não tenho dúvidas: o ponto negativo e todos os muitos pontos positivos são todos culpa e mérito de Zimberg e seu grande elenco. Viva, por isso, o teatro!

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Rodrigo Monteiro: Licenciado em Letras - Português/Inglês pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos.Bacharel em Comunicação Social - Habilitação Realização Audiovisual pela mesma universidade. E mestrando em Artes Cênicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Jurado do Troféu Açorianos de Teatro 2010 e, também, do Troféu Braskem 2010, é autor do blog www.teatropoa.blogspot.com de Crítica Teatral de Porto Alegre

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